Augusto Jobim do Amaral, em entrevista, fala sobre a segunda edição do livro Cultura da Punição: A Ostentação do Horror, publicada pela Editora Empório do Direito

09/09/2016

Augusto, fale sobre como escolheu o Direito e quais os planos para o futuro da sua carreira.

Essas questões são meio difíceis de serem respondidas, pois não trazem, sabemos, apenas escolhas deliberadamente conscientes, mas diria que a aproximação com o direito se deu pode-se dizer mais como um efeito da minha relação com as humanidades desde sempre. Alguma sensibilidade para a cultura e a política sempre tiveram espaço privilegiado na minha vida em geral. Talvez pela amplitude das inquietações, das questões que sempre me pus e da própria postura diante dos desafios urgentes que nos acometem nas relações humanas, o direito acabou por oferecer um canal amplo e privilegiado para vivenciá-las. Assim, a graduação em direito jamais foi senão um "pretexto" para que o contato estreito com problemas comuns de áreas afins continuassem a me tocar, como da filosofia, da história, da sociologia, da psicanálise, da ciência política etc., ou seja, para que um olhar transdisciplinar pudesse ter espaço. Foi assim na própria graduação com a intensa pesquisa já na área das ciências criminais, nas especializações, no mestrado e nos doutorados em Ciências Criminais e em História e Teoria das ideias. Sempre são complicados os prognósticos para o futuro, que o acontecimento pese mais que o projeto sempre foi algo importante para mim, quer dizer, planos mínimos sim, mas que o inusitado e o incalculável nunca deixe de nos surpreender. Objetivamente, sou docente por vocação há mais de 13 anos e há 4 atuo como professor da PUCRS, onde devo grande parte da minha formação. Especial sentimento este ano por poder iniciar a lecionar como Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais (Mestrado/Doutorado), junto daqueles que foram meus mestres num passado próximo e de amigos que tive a sorte de cruzar o caminho. Naturalmente minha força e ânsia para iniciar esta nova etapa são enormes.

Qual a proposta do livro "Cultura da Punição: A Ostentação do Horror – 2ª Edição – Revisada & Ampliada", publicado recentemente pela Editora Empório do Direito?

A proposta é muito direta, ainda que por caminhos bem diversos: apontar e enfrentar fortemente a naturalização da violência quando o assunto é o poder punitivo. Depois de termos dito a sorte de esgotar rapidamente a 1ª edição, procuramos aprofundar ainda mais as discussões que permeiam as formações punitivas na nossa contemporaneidade, em especial como se desenvolvem os fascismos societais via poderes de Estado. A resistência crítica à violência do poder punitivo, entendo, passa sem dúvida pelo convite à reflexão urgente diante da tragédia cotidiana da exceção tornada regra. Tal ferramenta do pensamento, ao não assumir tal condição como fatalidade, deve ter a responsabilidade aguda sobre cada momento de decisão perante o horror da morte das rotinas penais banalizadas.

Como surgiu a parceria com Alexandre Morais da Rosa e quais motivações para escrever sobre este tema?

A amizade com o Alexandre não lembro quando iniciou, talvez derivada de vários encontros com amigos em comum e principalmente por notá-lo também companheiro das mesmas leituras e problemas. Daí o carinho e a profunda consideração mútua já ultrapassam qualquer justificação. Referência desde sempre de um pensamento crítico foi uma honra poder escrever ao seu lado. As razões para a escrita da obra, ademais do dito acima, passa pela necessidade de afirmar permanentemente a desconstrução de uma estado de normalidade que faz com que suportemos a injustificável condição abominável da nossa tanato-cultura punitiva. No pensamento jurídico a necessidade torna-se ainda mais candente. Em que pese a dedicada tradição brasileira crítica na área, o coro precisa ser engrossado, e muito.

Conte como foi o processo de pesquisa para escrever a obra.

Da minha parte, contando com a paciência do Alexandre em suportar meu estilo, encaminhei o trabalho desde um braço da primeira tese de doutorado que escrevi em Portugal. A problemática da biopolítica, dos contornos e performances punitivas, bem como em geral os dispositivos autoritários sempre me fizeram questão. Na segunda edição especificamente, além da revisão e ampliação minuciosa, tentei contribuir com um ensaio sobre a "polícia" e sua relação com o poder soberano. Este sentido filosófico de uma zona de indistinção entre violência e direito sobre a qual paira a polícia, inclusive como paradigma de governo, penso ainda seja pouco explorado, não obstante tenha tentado avançar um pouco no texto.

Quais as principais conclusões adquiridas com a obra?

Tenho alguma prudência com categorizações conclusivas em matéria de cultura da punição. Não que elas não existam e que não as tenhamos trazido em abundância. Estão ali ditas. Sugerimos, porém, na obra mais enfaticamente indagações, inquietações e a mais profunda abertura ao diálogo. As ditas conclusões certamente saberão retirar os leitores quando entrarem em cena. Em tempos tão rarefeitos para o encontro com a alteridade e tão afeitos às respostas prontas e acabadas, a partir dos seus fascismos e de seus blocos unívocos de sentido, testemunhar um "não" peremptório a torrente punitiva ostensivamente posta parece ser de grande validade.

Fale sobre os planos para futuras publicações.

O ano de 2016 traz expectativas muito boas. De forma ampla, além de viabilizar a 2ª edição do "Política da Prova e Cultura Punitiva" (Almedina, 2014), estamos em vias de concluir, junto com o amigo Ricardo Jacobsen Gloeckner, sob o respaldo da RT (Revista dos Tribunais), um "Manual" de Criminologia. Além disso, ainda para este ano o selo da ARA Editores (Peru) publicará um outro livro em parceria com o Ricardo sobre a temática que temos perseguido no PPGCCrim da PUCRS chamado "Pensamento político-criminológico". Sobre a organização de obras, guardarei por enquanto ainda alguma surpresa, mas que será apresentada no momento oportuno aos leitores do Empório do Direito, a respeito de uma coleção de "Criminologia" pela EDIPUCRS com a edição e reedição de obras clássicas do nosso campo de saber. Fica o convite para que nos acompanhem.


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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