Técnicas e estratégias da negociação!

01/04/2020

A negociação está presente em nosso dia-a-dia! Desde que nascemos fomos de forma instintiva obrigados a negociar, seja para conseguir o alimento ou disputando um brinquedo com o amigo ou irmão. Com o passar dos anos esses conflitos de interesses aumentam na proporção das teias de relacionamento que criamos e a necessidade de negociar fica ainda mais evidente.

Em qualquer fase de sua vida a negociação estará presente. No ambiente profissional não é diferente, sobretudo quando empreendemos ou precisar superar uma crise. Ainda mais em tempos de coronavírus (covid-19), onde todas as relações foram, estão ou serão de alguma forma abalada e nada melhor do que gerenciar esse processo de harmônica.

Inclusive a legislação processual em diversas passagens demonstra que a autocomposição deve ser priorizada e somente nos casos em que tais conflitos não foram superados entre as partes é que o Estado deve ser chamado para entregar a solução (que algumas vezes não atende os interesses de nenhuma das partes envolvidas).

É o que se depreende do art. 334 do CPC, ao fixar que antes mesmo da formação do contraditório o Réu será intimado para participar de uma audiência de conciliação, de modo que somente após concretizada essa fase e uma vez infrutífera é que o processo seguirá o seu curso com a oferta de contestação e demais atos processuais. Lembrando que mesmo durante a tramitação do processo a busca por soluções consensuais é estimulada pelo legislador, nos termos do §3º do art. 3 do CPC: “A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”.

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, professor titular de Teoria Geral do Processo na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, destaca que “A intenção legislativa em privilegiar os meios alternativos de solução de conflitos é tão evidente, que admite-se o ajuizamento de produção antecipada de prova destinado a viabilizar a autocomposição do litígio (art. 381, II).”.[1]

No mesmo sentido, destaca Eduardo Cambi “O NCPC aposta em meios alternativos de resolução de controvérsias, por considerá-los mais adequados, rápidos, baratos e eficientes. Tais meios evitam a imposição de uma decisão pelo Estado-juiz, o que favorece o bom-senso das partes e contribui para a pacificação social. Nesse sentido, o NCPC não exclui da apreciação do Poder Judiciário ameaças ou lesões a direitos (art. 5.º, XXXV, CF/1988), mas estimula, sempre que possível, a solução consensual de conflitos, inclusive no curso do processo judicial (art. 3.º, § 3.º, NCPC).”.[2]

Aqui não se discute se o Poder Judiciário está ou não preparado para atender aos interesses da norma. Para aqueles que militam na área contenciosa é comum se deparar com despachos indicando que a insuficiência de recursos diversos (tempo, infraestrutura, pessoas etc.) inviabilizam a realização da desejada audiência preliminar de conciliação. Há também aqueles que sustentam que ela serve mais para procrastinar o andamento do processo.

Respeitados entendimentos contrários, acreditamos que a solução adjudicada além de mais custosa financeiramente (seja ela proferida pelo juiz togado ou arbitral) tende a ser mais demorada do que a consensual e em algumas oportunidades menos eficaz. Por essas razões devemos cada vez mais criar incentivos na autocomposição dos conflitos.

Quando se falar em matéria bancária, o benefício financeiro da negociação, sem qualquer dúvida, tende a ser maior para as partes do que quando o conflito de interesses é resolvido pelo judiciário, notadamente para os tomadores de crédito, vez que o lobby dos agentes financeiros junto aos Tribunais Superiores e casas legislativas acaba por fazer prevalecer teses que lhes sejam mais vantajosas, ainda que na contramão dos interesses sociais.

Nas lições de Carlos Eduardo de Vasconcelos, a negociação consiste em “... lidar diretamente, se a interferência de terceiros, com pessoas, problemas e processos, na transformação ou restauração de relações, na solução de disputas ou trocas de interesses. A negociação em sentido técnico deve se baseada em princípios. Deve ser cooperativa, pois não tem por objetivo eliminar, excluir ou derrotar a outra parte. Neste sentido, a negociação (cooperativa), dependendo da natureza interpessoal, pode adotar o modelo integrativo (para relações continuadas) ou distributivo (para relações episódicas). Em qualquer circunstância busca-se um acordo de ganhos mútuos.”.[3]

No presente artigo iremos nos dedicar sobre alguns aspectos do processo negocial. Na verdade, embora de forma resumida, abordaremos os sete elementos da negociação segundo o Programa de Negociação de Harvard, com o propósito de ajudar o nosso leitor a negociar melhor, de forma racionalizada e com maior efetividade.

Então vejamos:

1. Comunicação: Ponto de partida de toda negociação, uma boa comunicação é, sem dúvida, um diferencial durante o processo negocial. Seja ela verbal ou não verbal, a clareza deve orientar o negociador a fim de garantir a compreensão da outra parte. Inclusive o silêncio deve ser observado como um mecanismo importante para que você impulsione a parte contrária a realizar trocas ou concessões. Ouvir mais do que falar poderá auxiliar na identificação dos pontos comuns, necessários para se atingir um bom acordo. Demonstrar os ganhos que a parte contrária terá caso negocie, também pode ajudar conquistar os resultados desejados.

2. Relacionamento: Manter bom relacionamento com a parte contrária é imprescindível para garantir um desfecho favorável na negociação. Para tanto é preciso conhece-la, saber as suas preferências, seus valores, onde trabalha ou estuda, se tem família ou não. Geralmente, relacionamentos difíceis decorrem das diferenças de costumes entre as partes envolvidas no processo negocial. Portanto, procure se preparar e estudar a parte adversas. Identificar pontos comuns pode facilitar a construção de um ambiente favorável a negociação.

3. Interesses: Trata-se da razão pela qual as partes estão sentadas numa mesa para negociar. Identificar os seus próprios interesses e os da outra parte é, talvez, o que possibilitará que o sucesso na negociação. Pouco adianta horas de conversa se os interesses das partes são conflitantes. Quando falamos de empresas endividadas com bancos, por exemplo, pode ser a necessidade do empresário de reduzir a taxa de juros de um contrato, prolongar o prazo de pagamento ou mesmo conseguir novo crédito, enquanto que do seu gerente será, na maioria das vezes, receber o valor devido com o menor risco possível (as vezes vender um produto que você não precisa). Portanto, procure demonstrar que a sua proposta de acordo será mais vantajosa se aceita, pois os interesses do seu adversário serão mais facilmente atingidos.

4. Opções: São as possíveis soluções para a acomodação dos interesses das partes. A capacidade de elaborar cenários diversos para amoldar os interesses envolvidos certamente diferencia um negociador profissional ou preparado daquele que age institivamente. Aqui é importante partir da premissa de que em uma negociação a relação precisa ser ganha-ganha, que a solução para o problema enfrentado não é, necessariamente, única. Amplie a discussão com a parte contrária e tente auxiliá-lo na solução de problemas que, em tese, são apenas dele.

5. Legitimidade: Se a negociação é um processo de satisfação de interesses, dar um ar de legitimidade para as opções criadas é muito importante para que o outro compreenda que o resultado alcançado foi justo e adequadas. A legitimidade independe de caprichos, trata-se de um traço objetivo do processo negocial. A solução encontrada não é melhor porque eu acho ou porque eu quero. Ela é a mais adequada porque se montra com a opção mais justa e que irá gerar melhores resultados para ambas as partes.

6. Alternativas: Neste aspecto procura-se identificar se as opções construídas são realmente a melhor solução para você, ou seja, se o compromisso que está prestes a fechar é a melhor alternativa existente para atingir os seus interesses. Até porque não fechar o acordo costurado pode ser uma opção. E neste caso talvez uma das partes se prejudique ainda mais do que fechar o “mau acordo”. Significa dizer que quem de fato tem poder na negociação é quem não precisa dela para atingir os seus objetivos, não quem mais poder econômico.

7. Compromisso: O último elemento da negociação é o compromisso. Ultrapassadas todas as etapas, as partes precisam ajustar que os termos alinhados sejam firmados em instrumentos que traduzam os seus interesses. Aqui todo o cuidado é pouco! Contar com o apoio de profissionais habilitados para elaborar ou revisar os contratos que serão assinados pode ser um divisor de águas para o sucesso da negociação.

Agora que conhecemos todos os passos envolvidos no processo de negociação e os elementos que devem ser observados para construção de um acordo, procure aplicar esse conhecimento no seu dia-a-dia, especialmente para cuidar das finanças de sua empresa neste momento tão delicado de crise.

Lembre-se de separar pessoas do problema, de se concentrar nos interesses e não nas posições. Procure sempre identificar opções de ganhos mútuos e insista em critérios objetivos.

 

Notas e Referências

[1] In Breves comentários do código de processo civil (livro eletrônico) / Teresa Arruda Alvim Wambier... [et al.], coordenadores. – 1 ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 17.

[2] Op. cit., p. 829.

[3] In Mediação de Conflitos e práticas restaurativas. São Paulo : Método, 2008, p. 35.

 

Imagem Ilustrativa do Post: two person shaking hands // Foto de: Oleg Magni // Sem alterações

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