Pensamento Pós-Hermenêutico: um contraponto cibernético à subcultura da interpretação - PARTE III

02/08/2022

Parte II

Neste passo expositivo do Pensamento Hermenêutico, pretendo mostrar que as precondições necessárias à prática da interpretação estão ausentes de nosso viver cotidiano hodierno, pois é fato biológico que os seres humanos ouvem desde si; não podem determinar o que os outros ouvem; não distinguem entre ilusão e percepção no fluxo da experiência; limitam-se a desencadear no ouvinte um processo de escuta sem ter acesso prévio ao critério de validação, visto que as interações linguísticas são intrinsecamente não informativas.[1]

A condição hermenêutica postulada pelo Pensamento do Norte do Mundo (PNM), em particular pela filosofia hermenêutica (Heidegger), pela hermenêutica filosófica (Gadamer) e pela filosofia da linguagem (Wittgenstein), tal como descrita na parte I deste trabalho, é, portanto, insustentável, pelo menos até que alguém contradiga a biologia, mostrando que intérpretes não operam como seres vivos e que seus sistemas nervosos captam informação do meio. Se isso não for possível, nada impede que sigamos interpretando, porém sabendo que não estamos condenados a fazê-lo.

Na parte I deste trabalho, teci ligeiras considerações a respeito da humanidade do Homo sapiens-amans, para reafirmar sua tríplice dimensão bioculturofenomenoló­gica. E fi-lo porque, no viver e conviver dos seres humanos, o que não ocorre na linguagem não diz respeito à atividade humana. Com efeito, a biologia nos mostra que a humanidade não se encerra na corporalidade. Esta apenas sinaliza a possibilidade do humano e não é causa de seu comportamento. Em assim sendo, qualquer organismo da espécie Homo sapiens somente se constitui humano quando acoplado ao domínio relacional próprio dos humanos.

Outra relevante condição ainda subsiste, entretanto. Para que tal acoplamento relacional se viabilize, necessária se faz a mediação da linguagem, que, num sentido antropológico, além de conotar a origem do humano como tal, consegue arrancar do âmbito da pura estrutura material a biologia humana e, no domínio desta, incluir uma estrutura conceptual, fazendo possível um mundo de descrições em que o ser humano pode conservar, plasticamente, sua organização e adaptação (MATURANA, 2003, p. 83).

Sem embargo, apesar de ter me dado conta de que a interpretação funciona como um truque epistemológico tendente a mascarar desejos, ganas e preferências de quem dela faz uso, desde um suposto pano de fundo racional, reconheço que sua particular história não pode ser ignorada. De fato, para tê-la inútil, a hermenêutica não poderia agradar a tanta gente. Sou forçado a admitir, porém, que a atividade interpretativa é praticada em pelo menos 193 países, nas instituições de ensino, nos meios de comunicação, em todos os centros de investigação e produção acadêmica do mundo, nos parlamentos, nas igrejas, nos congressos, na literatura, ciência, filosofia, enfim.

De todo modo, o fato de ser aceita não invalida a conclusão de que a condição hermenêutica é inviável epistemológica e ontologicamente, como será visto mais adiante. Nada é um mal em si, inclusive a interpretação, que mata, é verdade, mas também salva. Sucede que algo é um recurso ou uma oportunidade se o desejamos como tal. São as preferências e os desejos que movem os seres humanos. Tal como uma enfermidade, também a hermenêutica é passível de desejo ou repulsa. Quanto a mim, ao fim desta reflexão, passo a tê-la como uma narrativa inerente ao discurso matriarco-patriarcal hegemônico, desde a epifania de Hermes na Grécia Antiga.

 

1 O Locus da Interpretação

A meu ver, a interpretação não constitui apanágio metafísico ou antimetafísico, realista ou antirrealista, de certo paradigma, de uma episteme ou de alguma escola filosófica, em particular. Consiste, isso sim, num aspecto de nossa vida de relação cotidiana ou, mais precisamente, de uma coerência operacional própria e apropriada à rede fechada de conversações que emergiu, conserva-se e nos enlaça desde o cruzamento de tradições pastoris indo-europeias com culturas matrísticas pré-patriarcais, por volta do séc. XV a.C., na Europa Antiga (EISLER, 1987; GIMBUTAS, 1982 e 2014).

Por outras palavras, o que ouso afirmar é que quem diz que interpreta, consciente ou inconscientemente, não se limita a manifestar adesão a uma racionalidade epistemológica pretensamente objetiva, haja vista que, de per si, a própria condição de intérprete, a menos que seja admissível a existência de hermeneutas num vazio relacional, situa-o no domínio de uma rede fechada de conversações ou cultura especifica, cujo emocionear[2] guia-o no seu operar como tal. E essa rede de conversações a que me refiro não poderia ser outra senão a que evocamos com rótulo genérico de cultura patriarcal europeia (MATURANA; VERDEN-ZÖLLER, 2011).

Efetivamente, o ato de interpretar, como qualquer atividade humana, encerra um modo de viver, uma certa maneira recorrente de organizar nossos fazeres, sentimentos e emoções, para nos conduzirmos, consensual e plasticamente, no meio cambiante, sempre nas fronteiras de uma rede de conversações especificada por certo emocionear, posto que sistema autopoiético molecular (ou ser vivo) nenhum sobrevive no vácuo, desatado de um nicho ecológico, inclusive os hermeneutas. Com efeito, nas luminosas palavras de Verden-Zöller (1993, p. 84):

[...], todo fazer humano ocorre em conversações, como coordenações de coordenações consensuais do fazer e do emocionar. E toda atividade humana existe como uma rede de conversações. Isto é: o cozinhar, a medicina, a olaria, a agricultura... são redes de conversações imersas em redes de conversações que definem as culturas nas quais as pessoas vivem.[3]

A interpretação, por óbvio, enquanto suposta atividade humana, não escapa a essa abstração fenomênica. Por conta disso, conquanto saibamos, atualmente, que a convencional condição hermenêutica não mais se sustenta ante os fatos biológicos de que todo ser humano: a) ouve desde si; b) não pode especificar o que o outro ouve; c) limita-se a desencadear um processo de escuta em quem o ouve; d) não dispõe de mecanismo neurofisiológico  apto a distinguir no fluxo da experiência entre ilusão e percepção; e) não pode falar senão desde seu viver cotidiano e explicá-lo com as coerências de seu próprio viver de um amanhecer ao outro, há quem insista na prática da interpretação, convencional ou filosófica (DÁVILA; MATURANA, 2015b).

A biologia mostra, de fato, a partir de evidências verificadas em laboratório, que seres vivos humanos não dispõem de mecanismo operacional que os capacite a ter acesso privilegiado ao real preexistente às operações de distinção do observador multissensorial, visto que o sistema nervoso, por conta de sua determinação estrutural, “não opera com uma representação do mundo”[4] (MATURANA; VARELA, 2003a, p 138, tradução nossa). Ora, sem a suposta realidade transcendente à origem do observador (um preconceito, uma tradição, um ente em si, uma eloquente pré-compreensão, por exemplo), a noção de interpretação converte-se numa enigmática profissão de fé.[5]

Na verdade, nesses ajustamentos de ordem poética – e não é por acaso que somos todos poetas... (MATURANA, 2021) –, há fortes indícios de que o Pensamento Hermenêutico já não ignora, como bem alerta Enaudeau (2006, p. 232-233, tradução livre), que, “definitivamente, a representação não implica um quadro mental, interior e incomunicável, nem a percepção imediata de um objeto interior, senão o esforço por acolher a polissemia do percebido, [...]. Não é portanto um estado, mas uma prática, uma técnica, uma maneira de tratar o percebido, que não explicam as palavras usuais nem as simples imagens...”[6].

Sem embargo, convém registrar que, não obstante questione os fundamentos do conceito clássico de representação, como forma especular ou mimética da realidade (externa ou interna), o Pensamento Hermenêutico prefere seguir representado (de outro modo, porém representando), motivo pelo qual resolve acrescentar mais uma às múltiplas concepções representacionistas forjadas pela filosofia ocidental. Eis então que dita categoria ganha a forma de mero sistema simbólico, que Da Silva (2014, p. 90) passa a denominar representação pós-estruturalista, asséptica a quaisquer conotações realistas e/ou mentalistas.        

Isto significa questionar quaisquer das pretensões miméticas, especulares ou reflexivas atribuídas à representação pela perspectiva clássica. Aqui, a representação não aloja a presença do "real" ou do significado. A representação não é simplesmente um meio transparente de expressão de algum suposto referente. Em vez disso, a representação é, como qualquer sistema de significação, uma forma de atribuição de sentido. Como tal, a representação é um sistema linguístico e cultural: arbitrário, indeterminado e estreitamente ligado a relações de poder. (DA SILVA, 2014, p. 91)

Tudo indica, desse modo, que a dificuldade não reside na metáfora da representação, mas em quem dela faz uso inadequado, visto que qualquer observador, sem necessidade de interpretar ou de supor um background transcendente ou preexistente a si, tem, como tal, acesso simultâneo aos dois domínios de existência humana: o fisiológico e o relacional. O que lhe permite, desde uma perspectiva mais abarcadora, descrever, a partir de correlações estabelecidas entre domínios disjuntos, “a conduta do organismo como se fora produto do operar do sistema nervoso ― com representações do meio ―, ou como expressão de algum processo intencional ou direcionado a uma meta” (MATURANA; VARELA, 1995, p. 162, travessões nossos).

A tempo, ressalvo, porém, que tal descrição tem caráter apenas comunicativo, por não refletir, biologicamente, a dinâmica operacional do sistema nervoso –, que não opera com representações do meio, repita-se. Assim, esquadrinhada a representação, nesse contexto, a interpretação perde seu encanto, sua poderosa e arrebatadora capacidade de seduzir, pois deixa de aparecer como uma banal atividade levada a efeito quando miramos um texto, um objeto, um poema, uma paisagem, um ente, uma fórmula legal, para transmudar-se numa conversação peculiar ao sufocante modo de vida patriarcal europeu.

Por tudo isso, sem qualquer menosprezo à importância das palavras no processo comunicativo, em que operam como comunicabilidades[7] ou nós da rede linguística[8], ou máscaras de coordenações consensuais e recursivas de condutas ocorrentes nos domínios linguísticos, é essencial que nos apercebamos de que é no linguajear[9] ou, mais precisamente, no conversar e reflexionar que, efetivamente, as coisas acontecem ou aparecem recursivamente como entes, estados, situações ou objetos,[10] por razões que explicitarei mais detidamente em outra parte deste trabalho.

Convém antecipar, entretanto, que o linguajear, enquanto coderiva recursiva de coordenações consensuais de comportamentos, não se encontra determinado pela descrição semântica atribuída às condutas, mas sim pelo acoplamento estrutural.[11] Como já vimos na parte I, com efeito, sem prejuízo de opiniões em contrário,[12] temos que as palavras não substituem a experiência e “não designam absolutos, entes em si ou conceitos, a menos que sejam definições formais”[13] (MATURANA, 2011b).

Seja como for, mesmo no caso dos formalismos matemáticos, todo substantivo acaba ocultando um verbo; e, assim também, um fazer, um sentimento, uma emoção, na medida em que todo verbo é expressão de uma ação especificada pelo emocionar. Por esse motivo, como qualquer fazer, inexiste argumento racional imune às emoções, porque o ponto de partida de todo argumento, sua premissa básica, resulta de uma escolha e essa opção, necessariamente, dá-se no campo das preferências e dos desejos (DÁVILA et al., 2009; MATURANA, 2000).

Podemos concluir, então, que a captura do sentido de um ente, fato, estado, situação, valor, por intermédio de procedimentos hermenêuticos, mais se avizinha de uma realidade imaginada que de um operar biológico efetivo, pois tal operação involucraria: a) o observador; b) a experiência; c) a linguagem, como coderiva comportamental[14]; d) a distinção; e) a interação; f) os sistemas interatuantes e seus respectivos nichos ecológicos; g) o meio envolvente; h) o acoplamento estrutural; i) as emoções especificadoras das condutas para que estas possam ser consideradas ações; j) os modos de escutar e sensorialidades: dos sistemas interatuantes e do observador; l) a descrição semântica das coordenações de condutas.

Em seu viver cotidiano, os hermeneutas, seres emocionais, singulossociais e antropoecológicos como o são todos os Sapiens, esforçam-se para ocultar as emoções; não porque não possam, talvez, viver e conviver sem elas, mas, certamente, para manifestar conformidade com a epistemologia de sua cultura ou, então, retroalimentar as regularidades constitutivas da rede fechada de conversações em que se encontram imersos, em cujo domínio a mal compreendida razão foi consagrada e segue sendo venerada no Ocidente pelo menos desde o séc. VII a.C. (NAY, 2007, p. 18).

De toda sorte imaginemos, agora, todos esses dados antepostos sopesados (de “a” a “l”) por um sagaz intérprete para formar um sentido objetivo comum (universal), como propõe a tradição hermenêutica. Se essa tarefa for exequível e efetivamente realizada, seremos constrangidos, portanto, pela força das evidências, a aceitar que certas atividades somente são factíveis à mentalidade do Norte do Mundo, que, fazendo jus às suas façanhas, também resolveu criar um tipo humano à sua imagem: o homem hermeneuta.

Segundo a nova ciência, porém, quando fazemos a pergunta pela arte de interpretar, no espaço pós-hermenêutico do fazer (Tun), no qual o que existe somente existe como processo no operar do observador, que “observa, vê algo, afirma ou nega sua existência e faz o que quer que faça”[15] (MATURANA; POERKSEN, 2011, I, 1., p. 3, tradução nossa), finalmente, podemos nos dar conta de que: “no tiene sentido decir que en el acto de conocer el observador capta, aunque sea de manera indirecta, la esencia de esa realidad transcendente, o hace una interpretación de esa realidad subyacente como una aproximación conceptual a su en sí”[16] (DÁVILA e MATURANA, 2008, p. 115). Voltarei ao assunto mais logo.

É inocultável, portanto, a existência de atividades humanas ou conversações transfiguradas de interpretações. E isso acontece pelo fato de animais humanos viventes não necessitarem de faculdade ou estrutura interpretativa in fieri para moverem-se num certo espaço cognitivo, porque o combustível que efetivamente os impulsiona são os sentimentos, as emoções. Mesmo Aristóteles (2010, p. 124 et seq.), que, desde uma perspectiva teleológica, apontou a razão como a faculdade essencialmente humana, reconhecia o desejo como motor da atividade humana[17].  

Na realidade, nenhum ser humano necessita explicar ou interpretar algo para viver, na medida em que o viver que vivemos e com o qual convivemos, na arquitetura dinâmica duma unidade ecológica organismo-nicho, resulta da espontaneidade do próprio viver. Nada em nosso viver é intencional ou proposital “porque en el vivir no hay propósito ni intención, y lo que le ocurre a un organismo en el fluir de su vivir es sólo un aspecto del fluir de su vivir”[18] (DÁVILA; MATURANA, 2008, p. 225). Se, por alguma razão, entretanto, problematizamos nossas experiências e resolvemos explicá-las, não temos outra opção senão fazê-lo com as coerências operacionais de nossas próprias experiências. É dessa maneira que surgem as narrativas, os mitos, que, quando aceitos, passam a guiar nossa vida de relação.

Parece válido e oportuno também destacar que, no domínio relacional humano, não há espaço para fatalismos. Somos autônomos, mesmo em face da heteronomia, porque, estritamente, só fazemos o que queremos, ainda que, eventualmente, aleguemos que somos forçados a fazer algo a contragosto. Quando dizemos que fizemos algo sem querer, no fundo, é porque queremos conservar outra coisa que supomos mais valiosa. O senso ético de responsabilidade é a primeira e única fronteira capaz de deter a ação humana. A existência de criminosos e pecadores mostra que moralidade e juridicidade são insuficientes nesse aspecto.

Não “estamos condenados a interpretar”, portanto, como propõe a hermenêutica filosófica (STRECK, 2014a, 2014b e 2017). Quem, todavia, admite a interpretação em seu viver cotidiano, com essa aceitação, abre espaço para modificações estruturais na relação de acoplamento com o respectivo entorno, o que lhe possibilita atuar nas multivariadas redes de conversações como se, efetivamente, intérprete fosse. Quer dizer, para quem se acha intérprete, não importa o determinismo estrutural que o afeta enquanto sistema autopoiético molecular, mas sim a realidade imaginada na qual acredita ativa ou passivamente.

Cumpre ressalvar, no entanto, que o nó górdio da interpretação não é o fato de reduzir-se a uma crença que se conserva e se realiza em redes de conversações da cultura patriarcal europeia. As crenças estão aí e mobilizam cotidianamente a humanidade. Na parte II, invoquei o professor Harari (2018, Part Three, 2., p. 9) para afirmar que, lato sensu, a cooperação humana, em grande escala, funda-se em mitos[19]. O problema é que o acesso a esse tipo de imagined reality[20], ao fim e ao cabo, constitui privilégio de autoridades, dominadores, conquistadores e, quando muito, de aliados ou apaniguados do establishment da ocasião.

A atenção do escutar interpretativo nunca está centrado na legitimidade daquilo que o outro ouve, vê, diz, sente ou faz, mas sim na percepção egocêntrica do próprio intérprete diante de uma suposta realidade transcendente ou preexistente a si. Nessa relação, o hermeneuta acha-se capaz de se apropriar objetivamente da verdade percebida e espera vivamente que outros intérpretes coincidam com sua percepção, abrindo espaço para relações de exigência e submissão quando suas expectativas não se realizam.

É evidente que as conversações hermenêuticas não vingariam por si mesmas num modo de vida tão complexo como o do patriarcado europeu. Para se sustentarem e angariarem alguma legitimidade no âmbito cultural, são associadas a artifícios retóricos aparentemente cândidos, mas que, no fundo, existem para confirmar o conjunto autoritário da obra, como sejam as noções de tolerância, igualdade, solidariedade. Isso, porém, não funciona porque, nolens volens, todo intérprete se autoproclama intrinsecamente não responsável pelo que ouve, vê, sente, fala e faz.

Ao invés de marchar no espaço psíquico[21] da confiança, da colaboração, da honestidade, da reciprocidade, do respeito por si e pelo outro na coexistência, da coinspiração, sem hierarquias, exigências e expectativas egoísticas, o hermeneuta, quando contrariado em suas percepções supostamente racionais, estando impedido ou não querendo destruir imediatamente o oponente, retarda a ação, invocando o signo da tolerância, para levar adiante seu desiderato no momento oportuno ou mais conveniente.

É evidente que não se trata de ver a tolerância como sinal de respeito pelo outro, porque o comportamento respeitoso se encontra especificado pela emoção do amar – a única disposição corporal que amplia a inclusão, o cuidado, o acolhimento, o conversar e a reflexão, e nem sempre quem tolera reconhece a legitimidade das diferenças do outro como outro na coexistência. Pelo contrário, o ato de tolerar oculta sempre uma pretensão sujeitadora. Trata-se, na verdade, de recuo à espera da oportunidade adequada para subjugar. Quem tolera apenas ratifica o emocionear hierárquico, autoritário, competitivo, apropriador, dominador, que especifica a cultura patriarcal europeia.

O respeito não postula a igualdade porque somos diferentes, mas se associa à equidade relacional e ao reconhecimento da legitimidade das diferenças do outro. Não são poucas as ditaduras, as autocracias que se sustentam com base na hipocrisia, no cínico discurso da igualdade, da esperança, da solidariedade. Quem marcha na trilha do respeito prescinde de solidariedade, porque quem respeita acolhe o outro em seu viver; não agride, confia, colabora, compartilha espontaneamente, atua com responsabilidade, sem expectativas e exigências. Mas queremos isso? Talvez optemos por falar de utopia, outra maneira hipócrita de negar as alternativas que nosso viver nos proporciona. 

Enfim, as condições que pugnam por igualdade, tolerância, liberdade e fraternidade não têm sequer tempo de aparecer numa rede de conversações guiada pelo emocionear do respeito ou do amar. Ora, só tolera quem pode tolerar; só deixa quem pode deixar (“laissez-faire laissez-passer”). Quem flui no domínio emocional do amar não tem como “deixar”, porque o deixar oculta assujeitamento, de modo que é incompatível com um modo de vida, cuja ação do outro só encontra limite em seu próprio senso ético de responsabilidade, centrado no respeito por si e pelo outro, na honestidade, na confiança, na colaboração, na equidade, na reflexão, no fazer democrático.

Desse ponto de vista, tanto quanto o deixar fazer, o deixar passar, o igualar, o tolerar, o solidarizar, o libertar, o interpretar tem seu lugar na cultura patriarcal europeia em que nos encontramos imersos, seu locus conversacional desde a origem do deus Hermes. Aqui, se eu próprio estivesse agindo como intérprete, poderia mesmo, hipocritamente, justificar que não sou eu mesmo que estou dizendo isso, porque cientistas da estirpe do biólogo Humberto Maturana, de há muito escancara essas contradições:

Com efeito, no viver cotidiano da tradição greco-judaico-cristã a que pertence nossa moderna cultura científica e tecnológica, a realidade e o real são ar­gumentos que usamos em nossa coexistência humana cada vez que tentamos obrigar outro ser humano, sem usar a força, a fazer algo que queremos, supondo que o outro não fará espontaneamente. Nessa tradição, o mesmo se passa com as noções de razão e racionalidade que usa­mos como argumentos para obrigar ou convencer, sob a suposição cultural implícita de que através delas fazemos referência a verdades transcendentes universais[22]. (MATURANA, 1997, p. 115, tradução livre, grifos nossos)

 

2 A Natureza da Interpretação

Confesso que já fui tentado a opor uma negativa geral à interpretação. Fiz isso durante um diálogo que travei, em janeiro de 2012, com el Doctor Humberto Maturana Romesín[23]. No calor da interlocução, por sinal, o biólogo chegou a apoiar minha ilação de que a interpretação não existe[24]. Sem que eu soubesse, porém, de que ele, de há muito, tinha chegado à mesma conclusão. Dei-me conta disso logo depois desse encontro, em Santiago do Chile, ao ler uma entrevista do cientista, publicada vinte e um anos e nove meses antes do nosso diálogo (CURSO ..., 2012).

Realmente, em abril de 1990, durante uma entrevista concedida a uma revista chilena, ao responder à pergunta: “- Então não há uma realidade objetiva, porém a interpretação que faço dela?”[25], Maturana argumentou que: “- Nem ao menos se pode dizer que exista algo como real. Tampouco que se interpreta a realidade. O que podemos afirmar é que configuramos o mundo em que vivemos na convivência”[26] (MATURANA, 1990, tradução nossa). Em 2008, revisitando o tema, o biólogo reafirmou que “não tem sentido dizer que no ato de conhecer o observador capta, mesmo de maneira indireta, a essência dessa realidade transcendente, ou faz uma interpretação dessa realidade subjacente como uma aproximação conceitual do seu em si” (MATURANA; DÁVILA, 2009, p. 101).

A alusão a esses marcos temporais, de fato, não é casual. Como mostro em Ximena Dávila: quem é esta mulher? (SANTOS G., 2021), em 1990, apesar de já ter rompido com o pensamento tradicional, “o sistema científico desenvolvido por Maturana-I permanecia salpicado por grânulos ontológicos, cuja circunstância se evidenciava na marcante distinção entre ‘ontologias transcendentes’ e ‘ontologias constitutivas’ (MATURANA, 2002)”. Para, no entanto, manter-se coerente com as consequências de sua compreensão biológica do conhecimento, o cientista chileno não hesita em negar valor explicativo à interpretação.[27]

Sem embargo, mesmo que a inexistência da interpretação possa ser sustentada ao menos desde duas perspectivas – a ontológica e epistemológica –, como o fizera Maturana, sou forçado - pela coerência de meu próprio pensar - a reconhecer a atividade hermenêutica como uma narrativa[28], uma arraigada crença ou, mais uma vez recorrendo à terminologia do professor Yuval Noah Harari, uma realidade imaginada (“imagined reality”), componente da cola mítica (“mythical glue”) que une famílias, clãs, tribos, grandes grupos de indivíduos, intelectuais, educadores, juristas, filósofos, cientistas, jornalistas, editores, comunicadores, e, à diferença dos chimpanzés, “nos tornou os mestres da criação”[29] (HARARI, 2017, p. 47; 2018, Part One, 2., p. 22).

É que, de modo geral, seres humanos prescindem de coerência filosófica, ontológica ou epistemológica para viver e conviver, porque sobrevivem apoiando-se em erros, equívocos e mitos que, enquanto não frustram expectativas, não interferem na ação, tendem a satisfazer a multivariados intentos humanos. Foi o antropólogo britânico Gregory Bateson que me despertou para essa fundamental dimensão de nosso viver cotidiano, coerente, por sinal, com a abordagem bioculturofenomenológica do pensar, quando admite que quem erra não sabe que está errando, a menos que esteja mentindo. De fato:     

[…]. No caso dessas proposições epistemológicas, o erro, além de não ser facilmente detectável, é impossível corrigi-lo prontamente. […]. As falsas premissas, de fato, funcionam bem, mas, por outro lado, aplicam-se somente até certo limite. E se, em certo estágio e sob determinadas circunstâncias, alguém arrasta graves erros epistemológicos, pode dar-se conta de que tais suposições não mais se sustentam. Então, nesse momento, descobre com pavor o quanto é difícil livrar-se de um erro pegajoso. É como se tocássemos em mel. [30] (BATESON, 1978, pp. 478-479, tradução livre).

Vale pontuar, entretanto, que a adesão a mitos e erros em nosso viver cotidiano não é fenômeno recente. Avanços e retrocessos nos campos da filosofia e da ciência são excessivamente comuns. Como bem ilustra Enaudeau (2006, p. 209-210), o filósofo “Wittgenstein ... atribui às palavras o papel que Kant imputa às representações transcendentais, aqueles conceitos a priori que são o esquema de leitura de todo objeto conhecível.”[31]. Por essas e outras razões que mais logo explicitarei, ratifico, então, a despeito do que pensara Nietzsche[32],  que o fenômeno interpretativo – ou hermenêutico, como se queira – existe; isso, porém, na rede patriarcal de conversações, como um mecanismo conceptual, uma noção ou coerência operacional própria e apropriada de tal modo de vida.

Nada é um mal em si, inclusive a interpretação. A estupidez mata, sabemos disso, mas também salva. O problema da hermenêutica não reside nela mesma, mas sim no uso irresponsável que dela é feito. Mesmo que se negue, todo hermeneuta é, por regra, avesso à responsabilidade e, quando pode, tenta dela desvencilhar-se, imputando-a a quem não coincide com suas distinções, preferências e desejos. Não estou propondo, entretanto, a responsabilidade em si. Não. A não responsabilidade tem correspondência com uma coerência operacional peculiar ao modo de vida patriarcal, em cujo domínio relacional todo hermeneuta flui. É isso que afirmo. O juiz não condena ou absolve: cumpre a lei; o carrasco não mata, cumpre a lei; o autocrata não declara guerra porque age para proteger estrangeiros em nome da paz.

Compreendo, todavia, que, para tê-la na conta de imprestável, a arte de interpretar não poderia agradar a tanta gente. O fato, porém, é que a interpretação é praticada e aceita universalmente como conduta banal em 193 países,[33] nas universidades, escolas, nos meios de comunicação, na imprensa, nas editoras, em todos os centros de investigação e produção acadêmica do mundo, nos parlamentos, nas igrejas, nos debates, congressos, lives, webinários, conferências, periódicos, livros, revistas, na poesia, literatura, ciência, filosofia, nas rodas de conversa, na mídia enfim.

Ora, se funciona em tantos espaços, por que então censurá-la? Se não bastara, são mais de dois milênios de incessante interpretação, desde o advento de Platão. É verdade! Sucede que algo é um recurso ou uma oportunidade, se o desejamos como tal. São as preferências e os desejos que movem os seres vivos, em particular os seres humanos (DÁVILA; MATURANA, 2008). Tal como uma enfermidade, também a interpretação é passível de desejo ou repulsa, a depender da forma como o observador multissensorial a distinga em seu operar na linguagem.

Efetivamente, é sempre saudável ter-se presente que enfermidade ou interpretação nenhuma preexiste à operação de distinção do observador. Ainda assim, após identificada, além da opção pela cura, se indesejável a doença, remanesce a possibilidade de conservá-la, se oportuna, como é caso do hermeneuta que prefere seguir interpretando, mesmo sabendo que não pode fazê-lo ontológica e epistemologicamente, ou do empregado que retarda tratamento de lesão laboral para permanecer afastado do serviço à custa do seguro social.

Como qualquer coisa, portanto, a interpretação só se torna um recurso cognitivo para quem a deseja. Afinal, como não se cansam de repisar os epistemólogos de ofício, Dávila e Maturana (2015b, p. 142-143, tradução nossa):

Nenhum acontecimento é verdadeiro ou falso em si; nada é válido ou inválido em si; nada é desejável ou indesejável em si; nada é bom ou mau em si; nada é real ou irreal em si; algo existe como surge no viver e conviver dos seres humanos ou não humanos, que o trazem à existência em sua vivência-convivência, da maneira que ali aparece e como surge na distinção do observador, precisamente porque nada é em si: algo existe somente enquanto surge na operação de distinção do observador que o faz existir ao distingui-lo.[34]

De fato, mesmo que Kant (2015) tenha despertado de seu sono dogmático, invertendo a equação gnosiológica para privilegiar o sujeito transcendental em relação ao objeto cognoscível, o pensamento convencional insiste no equívoco de que, ao observador multissensorial, é interditada a constituição do ser ex novo. É o que pensa Eco (1998, p. 52), por exemplo, um expoente do pensamento pós-moderno, para quem é somente possível interrogar o ser, porque encontramos “sempre e de algum modo algo já dado (mesmo que já ser dado não signifique já estar acabado e completo)”.

E, sob esse viés, então, o mundo tal qual “representamos é um efeito de interpretação” (ECO,1998, p. 47). Talvez seja também nessa linha de compreensão que o professor argentino Jorge Roggero, invocando Derrida, sustente “que todo decir tiene el carácter de una interpretación”[35] (ROGGERO, 2017, p. 118). Ora, mesmo que a atividade interpretativa inexista do ponto de vista ontológico e configure uma aberração epistemológica, um truque, por sinal, não é possível no atual estádio evolutivo da humanidade simplesmente ignorá-la.

É que toda palavra, como dizem Maturana e Varela (2003, p. 68) também tem sua ontogenia[36]. E não seria o vocábulo “interpretação” que escaparia a essa circunstância. A atividade hermenêutica tem, portanto, sua particular história e foi inventada num contexto dominado pelo programa metafísico medievo para depois tornar-se serva da metafísica moderna, que dela faz uso cotidiano, conscientemente ou não, como algo trivial (JOLIVET, 1965). A interpretação, queira ou não, tem tudo a ver com a metafísica do ser, cuja transcendência postula como condição de possibilidade sine qua non de sua existência e para ela fora criada como meio de acesso privilegiado a uma suposta realidade transcendente à origem do observador multissensorial.[37]

De qualquer maneira, ainda que a realidade não seja passível de interpretação e o ser em si reduza-se a uma forma criativa de poder restritivo, paradoxalmente, o ser (ontológico) pode nos ser útil, como sugere Umberto Eco (1998), sobretudo quando, procurando coisas, desejamos descobrir outras. Sendo assim, seria um desperdício abrir mão de um erro que funciona tão bem como estímulo à curiosidade, pois, estritamente: não podemos [validar ou] dizer que exista algo como o real [ou o ser em si], tampouco que possamos interpretar a realidade (MATURANA, 1990).

 

3 Experiências Culturais Hermenêuticas

3.1 Diálogo Russo

O mundo que distingo segue sendo uma consequência da cultura patriarcal europeia e, em particular, da subcultura hermenêutica, que embrutece e envenena as relações humanas ao menos desde o séc. XV a.C. No exato momento em que proponho esta reflexão, presencio uma nação tentando dominar outra. E a base desse intento, como sempre, é a verdade interpretativa do algoz conquistador. Ao atacar a Ucrânia, a Rússia alega que o faz em nome da paz e para proteger cidadãos do país invadido da sanha neonazista de um governo ucraniano. Tudo isso, evidentemente, é formulado, dito e comunicado numa linguagem simbólica muito bem articulada e com a retaguarda da censura autocrática.

A despeito da experiência vivenciada mundialmente pela humanidade, através das imagens de bombardeios e vítimas no território ucraniano, a Rússia tenta impor a narrativa, ou melhor, a interpretação de que não se trata de uma guerra, mas sim de uma “operação militar especial no Donbass”, motivo pelo qual decidiu censurar sua imprensa, proibindo-a de usar, em seus relatos sobre o conflito bélico, termos como “guerra”, “declaração de guerra”, “ataque” ou “invasão”[38]. Como consequência de pesadas retaliações econômicas impostas pela comunidade europeia e Estados Unidos, o autocrata russo resolveu esboçar uma ameaça global, colocando em alerta máximo seu arsenal nuclear.

Eis nosso presente cultural cambiante, neste instante associado à pandemia do coronavírus, enquanto a Rússia tenta impor sua verdade, chamando a sociedade ocidental, exclusive aliados, de mentirosa, por supostamente distorcer fatos, a cuja objetividade somente ela pode ter acesso[39]. E o motivo dessa cizânia não poderia ser outro senão uma interpretação, segundo a qual a eventual adesão da Ucrânia à OTAN[40] colocaria em risco a integridade territorial do invasor bem como a suposta existência de milícias neonazistas no País invadido/atacado, a despeito de este ser uma nação governada por um descendente de família judaica vítima do holocausto e eleito democraticamente.[41]

Nesse tipo relação destrutiva, porém, há sempre espaço para o diálogo[42]. Depois de experimentar uma retaliação econômica, sem precedentes, da comunidade internacional, a invasora Rússia resolveu convidar a Ucrânia para a primeira, segunda, terceira rodadas de negociações, enquanto segue bombardeando o território invadido e mirando suas ogivas nucleares de longo alcance na direção do Ocidente. Não obstante os diálogos, as bombas seguem trançando o espaço aéreo ucraniano. Nem o Papa, que classifica a invasão como “agressão armada”, tem sido capaz de apaziguar o furor bélico russo.[43]

O Diálogo Russo prossegue na mesa de negociações, mas sob fogo cerrado.[44] É claro que, a um observador atento e sério, a agressão russa não surpreende, pois se trata de conduta manifestamente coerente com o modo de vida em que nos encontramos imersos. Ao menos desde a invasão da ilha de Creta pelos aqueus, é assim que funciona nossa convivência cotidiana, mesmo que intercalada por períodos de tolerância ou de paz. Definitivamente, necessitamos compreender que vivenciamos um presente contínuo cambiante, e não um passado distante, imemorial. Somos, hoje, no presente, o que conservamos do passado.

Aliás, para que paz, se a luta, a guerra, a dominação, a desconfiança, o controle, as ameaças, as agressões não se efetivassem? A pace é, portanto, tanto quanto a interpretatione, a tolerância, o laissez-faire laissez-passer, regularidade operacional inerente à cultura patriarcal europeia. A condição para perceber esse fenômeno é simples: o desapego à hipocrisia, ao cinismo. Em todo caso, afirmações disruptivas como essas cobram evidências, sob pena de não serem levadas a sério num mundo absorto nessa geleia androcrática.

Por conta disso, no intuito de satisfazer essa exigência, submeto as proposições de Humberto Maturana, sobre a realidade, verdade e racionalidade, ao teste dos acontecimentos, trazendo à colação o celebre Diálogo Meliano, ocorrido no espaço relacional da Grécia Clássica. Antecipo, porém, que as aparências com a situação ucraniana não são mera coincidência, em virtude da recursividade dos fenômenos históricos. É essa recursão que me possibilita falar da cultura patriarcal europeia do séc. XV a.C. ao séc. XXI d.C.[45]

 

4.2 Diálogo Meliano

Em sua História da Guerra do Peloponeso (séc. V a.C.), narra Tucídides (460 – 395 a.C.) que Atenas, contrariada pela recusa de Melos em tornar-se sua aliada contra os espartanos e convencida da superioridade de seu arsenal bélico, resolveu suplantar o desaforo dos colonos melianos. Ao iniciar a incursão, sua infantaria, formada por dois mil soldados, encontrou, contudo, inesperada resistência, forçando-a a reavaliar a estratégia. Os atenienses então, ao invés de insistirem no uso da força física, num primeiro momento, resolveram dialogar com os ilhéus, propondo-lhes um pacto de autossalvação.

Ocorre que, ao dar-se conta da indisposição dos mélios para o acordo, Atenas resolveu então expor a crua realidade, tentando fazê-los perceber que, se o propósito deles fosse outro que não o de deliberar sobre a salvação da cidade à luz dos fatos evidentes diante de seus olhos, a conversa se encerraria ali; mas se, ao contrário, fosse o da própria salvação, então o diálogo poderia seguir adiante (TUCÍDIDES, 2001, p. 347, grifos nossos). A olhos vistos, como se pode constatar, a argumentação incorpora os quatro fundamentos básicos de qualquer raciocínio patriarcal apontados pelo biólogo Humberto Maturana: a realidade, a força, a razão e a verdade.

A realidade que os mélios tinham diante dos olhos era a iminente e potencial devastação de seu território. Durante o debate, Melos chegou mesmo a admitir que não seria páreo numa guerra sem o reforço dos lacedemônios contra os democratas atenienses. A espada, quer dizer a força, portanto, foi usada como um valioso anteparo ao argumento ateniense. Ademais, buscando esgotar o esforço diplomático antes de retomarem a invasão, os emissários tentaram mostrar a racionalidade de sua proposta, argumentando que a salvação da cidade seria ótima para ambos os lados, mesmo que a solução implicasse a escravização dos mélios.

No contexto da Grécia Clássica, esse raciocínio expressava, de fato, uma verdade inconteste, na medida em que “sempre foi uma norma firmemente estabelecida que os mais fracos fossem governados pelos mais fortes” (TUCÍDIDES, 2001, p. 44). É o que chamo realisticamente de lógica da espada. Para uma justa compreensão das razões de Atenas, devemos atentar, porém, para a circunstância de que, entre nossos ancestrais democráticos, o logos estava a serviço da polis; isto é, sua conotação era mais tendencialmente política que proposicional.

No frigir dos ovos, o racional apontava para o que coadunasse com os interesses da cidade, pouco importando a coerência lógica do raciocínio. O que importa, de fato, é que, estritamente, no evolver da história humana, o tema da interpretação jamais apareceu como uma questão relevante, quer do ponto de vista epistemológico quer sob o prisma das relações humanas, ao menos enquanto prevaleceu explicitamente a lógica da espada, segundo a qual “os fortes exercem o poder e os fracos se submetem" (TUCÍDIDES, 2001, p. 348).

De modo que situações comunicativas edulcoradas por frases do tipo: “essa é a minha (ou a sua) intepretação”; “essa não é uma interpretação razoável”; “trata-se de uma situação interpretativa”; “perfeita essa interpretação!”; “essa interpretação peca por falta de objetividade”; “trata-se de interpretação demasiado subjetiva”; “essa interpretação não corresponde aos fatos” não tinham qualquer valor prático. O que mostram os fundamentos bioculturais do humano é que a narrativa hermenêutica tem funcionado como instrumento cada vez mais sofisticado de mascaramento de uma cosmovisão autoritária.

Ora, se ainda fosse possível aos sofistas gregos propor um “de agora em diante”, a partir do mesmo marco temporal do qual lançaram um olhar retrospectivo ao séc. V a. C. para sustentar que os “homens provam que estão certos pela força das armas”[46] (EISLER, 1987, p. 118), mirando o séc. XXI d. C., em cujo soslaio de tempo nos encontramos ensimesmados, decerto não cometeriam exagero algum, pois, como nos mostram, hoje, o “então como agora” proposto por Maturana (1997), e, em especial, o fragoroso repúdio da 11ª Assembleia Geral Extraordinária das Nações Unidas à invasão russa na Ucrânia[47], as conversações patriarcais seguem dominando a cena cultural do Planeta, sob o signo da atividade hermenêutica oficializada  pela Declaração Universal dos Direitos Humanos no plano internacional[48].

Outrossim, nesse espectro sombrio, é possível arrolar ainda, e de imediato, o negacionismo cientifico de ocasião[49], a balbúrdia que acaba de instalar-se no Afeganistão[50], o conflito institucional em curso em Brasília[51], os ataques às torres gêmeas do World Trade Center[52] e ao Capitólio[53], as bombas atômicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki[54], o genocídio sérvio[55], o holocausto dos judeus[56], as constrangedoras farpas protagonizadas por juízes da Suprema Corte brasileira[57], a dizimação politeísta romana e a autodizimação cristã[58], o casuísmo interpretativo das Cortes de Justiça[59], o sequestro do Estado por organizações criminosas[60], a imposição da masculinidade nas relações de gênero em pleno séc. XXI d.C.[61]

Infelizmente, a limitação de espaço me impede de circunstanciar aqui as motivações que culminaram com a morte de milhões pessoas em conflitos bélicos ao redor do mundo. Creio, todavia, que a simples alusão aos 26 milhões de vidas humanas ceifadas em guerras envolvendo cinco países europeus – do séc. XII ao séc. XX d. C. – dá-nos ao menos uma vaga noção da barbárie intrínseca no modo de viver e conviver que cultivamos hodiernamente, centrado na apropriação, na luta, na conquista, na dominação do outro,[62] sempre justificáveis mediante “interpretações objetivas”.

Por isso, insisto, que a interpretação, a meu ver, traduz um aspecto nuclear do modo de vida patriarcal. Seu pilar, a realidade transcendente, ou orientação objetiva, nas palavras de Lévi-Strauss (1962), é o mesmo que alavancou horrores nos campos de concentração nazistas e que produziu outras monstruosidades satanizadas pela humanidade.[63] Mais ainda, de sua feição camaleônica, extraímos outra lição: o hermeneutismo comporta-se como uma espécie de bombril[64], pois tem mil e uma utilidades: ora é garantista, ora é tirânico; ora salva, ora mata; ora tolera, ora subjuga, ora finge.

Sem embargo, cumpre destacar ao menos uma diferença crucial entre o famoso esfregão de aço e a atividade hermenêutica: enquanto o bombril limpa sujeiras,  a interpretação, dependendo do nível de sofisticação, presta-se à ocultação de desejos e preferências inconfessáveis, à justificação da hipocrisia, de ditaduras, de práticas terroristas, de organizações criminosas, de genocídios e epistemicídios[65], tudo isso ao abrigo da misteriosa realidade transcendente e, por conseguinte, da pretensa racionalidade que dela deriva para sempre obrigar quem, de algum modo, não se encontra em condição de peitar a indiferença do outro na convivência.

Continuaremos nossas discussões na parte IV, pois que ainda temos algo a dizer.

 

Reconhecimentos

Esta reflexão eclodiu em mim num certo momento da minha adolescência, quando uma professora me convidou a interpretar um texto. A perplexidade que me abateu naquela fatídica situação de aprendizagem foi tão dramática que segue acesa depois de quatro décadas. Felizmente, outro professor me ajudou a perceber que nada é um recurso ou uma oportunidade se não o desejamos. Desde então, comecei a me libertar daquele trauma juvenil. A cura veio-me logo que conheci e recebi a atenção e o carinho de Ximena Dávila e Humberto Maturana, em cuja sabedoria ancoro minha presente história. Reconheço, porém, que meu rumo intelectual poderia ter sido outro se não tivesse antes cruzado com a amizade do resiliente jurista e professor Paulo César Busato, que, ao lançar luzes sobre minhas cegueiras culturais, ajudou-me a eleger a rota que me levou à Escuela de Pensamiento del Sur del Mundo.  Se não bastara, nessa deriva cultural, o Dr. Busato também me brindou um amigo e raro exemplar de humanidade, o jurista e professor Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, tão gigante, generoso e humilde quanto o próprio, a quem especialmente dedico esse singelo esforço reflexivo desde o Sertão da Bahia. Por fim, jamais poderia deixar de reconhecer o sacrifício, a compreensão e o apoio da minha família e de meus colaboradores que ajudam a tornar o meu viver edificante e prazeroso.

 

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[1] Sobre o assunto, ver parte VI.

[2] Cf. a distinção entre emocionar, emocionares e emocionear no Glossário (parte VI).

[3] “[…], todo el quehacer humano se da en conversaciones como coordinaciones de coordinaciones consensuales del hacer y el emocionar, y toda actividad humana existe como una red de conversaciones. Esto es, el cocinar, la medicina, la alfarería, la agricultura…son redes de conversaciones inmersas en redes de conversaciones que definen a las culturas en que las personas viven.”

[4] “A visão mais popular e corrente do sistema nervoso considera-o um instrumento por meio do qual o orga­nismo obtém informações do meio, de modo a construir uma representação do mundo que lhe permita calcular uma conduta adequada para sua sobrevivência. Assim, o meio imprimiria no sistema nervoso as características que lhe são próprias[sic] e este as utilizaria para gerar a conduta, como quem usa um mapa para traçar uma rota. Contudo, sabemos que o sistema nervoso, sendo parte de um organismo, opera com determinação estrutural” (MATURANA e VARELA, 1995, p. 162, com superficial adaptação da versão brasileira; Id., op. cit., p. 232).

[5] “[Then] our approach [to knowledge] changes completely. We can no longer accept descriptions of the nervous system as a system that computes representations of an external world and processes information coming in from outside, which then results in adequate behaviour and appropriate reactions of the organism. The nervous system now appears as a structure-determined system with its own specific mode of operation. Any change in it is only triggered but neither determined nor specified exclusively by the features and properties of the external world. It computes nothing but its own transformations from state to state. People who accept this insight must draw a strict conceptual distinction between the operations taking place inside the nervous system and all the processes occurring outside it.” (MATURANA; POERKSEN, 2011, I, 3., pp. 9-10).

[6] “En definitiva, la representación no es un cuadro mental, interior e incomunicable, ni la percepción inmediata de un objeto interior, sino el esfuerzo por acoger la polisemia de lo percibido, […]. No es por lo tanto un estado, sino una práctica, una técnica, una manera de tratar lo percibido, que no explican las palabras usuales ni las imágenes simples, […].”

[7] A “comunicação, que tampouco pode ser vista como ‘algo dado’, não deve partir dos símbolos, das palavras ou das mensagens, pois estes não passam de tecnologias, símbolos primários que, em verdade, representam comunicabilidades [Kumunikabilien]. Ao contrário, a comunicação baseia-se numa linguagem puramente conotativa, sendo a representação interna de um organismo que interage com uma representação interna de outro organismo, formando comportamentos estáveis (valores próprios). Segundo essa definição, dois sujeitos interagindo entre si recursivamente formam modos de comportamentos próprios estáveis que, ao olhar de um terceiro, aparecem como signos, símbolos, palavras, a saber, como comunicabilidades, pois realizou-se aí a biestabilidade. Uma interação entre dois sujeitos que satisfaça essas condições será, então, efetivamente comunicativa ‘se cada um dos dois vir-se através dos olhos do outro’, diz Heinz von Foerster na pág. 281 de ‘Conhecimento e consciência’ [Wissen und Gewissen]” (MARCONDES FILHO, 2006, p. 11).

[8]Nodes of the linguistic network”.

[9] Originalmente, Maturana (1988, p. 45; 2001, p. 12) usa a palavra inglesa “languaging”, traduzida para o castelhano como “lenguajear” a fim de enfatizar a natureza dinâmica e condutual da linguagem. Na língua portu­guesa não há lexema equivalente. Assim, com o mesmo propósito, traduzo-o como “linguajear”, para evocar o fluir de coordenações consensuais de coordenações de condutas ou fazeres na comunicação.

[10] Ainda, segundo Humberto Maturana: “el fenóme­no del lenguaje se basa, por un lado, en una congruencia estruc­tural especial que es el resultado de la historia de las interacciones. Si se considera qué condiciones deben darse para poder hablar de la existencia de lenguaje, se verá que debe haber una coordi­nación de coordinaciones de conductas. Los signos, digo yo, son secundarios, y no primarios para el lenguaje. La situación origi­naria de uso de lenguaje la puedo graficar con un ejemplo muy cotidiano: un hombre está parado en una calle de doble vía. Necesita un taxi, pero los taxis que pasan por su lado van todos llenos. Finalmente, gesticula a un taxista que pasa en sentido contrario, y cuando capta la atención del conductor, gesticula de nuevo, esta vez dibujando un círculo con su brazo en el aire. [...]. Resumiendo: cada vez que en el devenir de las interacciones nos encontramos con una co­ordinación de coordinaciones conductuales, tenemos que ver con lenguaje. Afirmo que esos son los procesos que tienen que pasar para que uno pueda decir que en una situación dada se usó el lenguaje.” (MATURANA; PÖRKSEN, 2004, pp. 105-106).

[11] Segundo Maturana: “Structural coupling arises if the structures of two structurally plastic systems change through continual interaction without destroying the identity of the interacting systems.” (MATURANA; POERKSEN, 2011, I, 5., p. 4). Cf. tb. Maturana e Varela (2003a, p. 137) e Maturana (2009b, p. 244).

[12] Escudado em Wittgenstein, sustenta Vives Antón (2011, p. 466) que o significado será buscado nas práticas sociais que: “delimitan objetos y conductas y permiten sustituirlos por símbolos lingüísticos, por las palabras. Las palabras adquieren, así, significado, en contextos de uso y toda extrapolación del contexto originario ha de asentarse, también, en prácticas”. El significado consiste, pues, en el uso que las palabras expresan simbólica­mente. Cuando utilizamos las palabras al margen de eso contexto, como a menudo ocurre en filosofía y también en Derecho, el significado ‹se toma vacaciones›: las proposiciones no dicen ya nada o, lo que es peor, distorcio­nan la comprensión”. Para Wittgenstein (2008, p. 356, afor. 560): »Die Bedeutung des Wortes ist das, was die Erklärung der Bedeutung erklärt.« D.h.: willst du den Gebrauch des Wortes »Bedeutung« verstehen, so sieh nach, was man »Erklärung der Bedeutung« nennt.

[13] “Las palabras no desig­nan absolutos, entidades en sí o conceptos fijos a menos que sean definiciones formales” (MATURANA, 2011).

[14] Cf. Parte I: Nota 14; Maturana (1997, p. 48); Tuckute (2022).

[15] “The observer observes, sees something, affirms or denies its existence, and does whatever he does.”.

[16] Traduzido para o idioma português em Maturana e Dávila (2009, p. 101).

[17] “Que é aquela faculdade da alma, a que chamamos ‘desejo’, que move, isso é evidente” (ARISTÓTELES, 2010, p. 128).

[18] “porque no viver não há propósito ou intenção, e o que acontece com um organismo no fluxo de seu viver é apenas um aspecto do fluxo de seu viver”.

[19] “Any large-scale human cooperation – whether a modern state, a medieval church, an ancient city or an archaic tribe – is rooted in common myths that exist only in people’s collective imagination”.

[20] Realidade imaginada.

[21] Sobre essa noção, vid. Maturana (1995, pp. 69-88; 2009b, pp.181-207; 2014)

[22] “En efecto, en la vida diaria de la tradición greco-judeocristiana a la cual nuestra moderna cultura científica y tecnológica pertenece, la realidad y lo real son ar­gumentos que usamos en nuestra coexistencia humana cada vez que intentamos forzar a otro ser humano, sin usar la fuerza, a hacer algo que queremos, y que el otro no hará espontáneamente. Lo mismo pasa en esta tradición con las nociones de razón y racionalidad que usa­mos como argumentos para obligar o convencer, bajo el supuesto cultural implícito que a través de ellos nos referimos a verdades trascendentales universales.”

[23] Humberto Maturana Romesín graduou-se em anatomia e neurofisiologia pela University College of London; obteve o título de Doutor, em biologia, da Harvard University, tendo registrado no seu currículo uma marcante passagem pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), a convite do neurofisiologista Jerry Lettvin,  e outra pelo Biological Computer Laboratory  (BCL), da University of IlIinois, a convite do cibernético Heinz von Foerster. Professor emérito da Universidade do Chile, onde fundou o Laboratório de Epistemologia Experimental, e ganhou o Prêmio Nacional de Ciências (1994). Falecido em 06/05/2021, Maturana é lembrado, também, como autor da Teoria da autopoiese no campo da biologia.

[24] Após ouvir atentamente a exposição de Maturana sobre os fundamentos da novel epistemologia unitária, argumentei que sua explicação proclamava o fim da interpretação. Entretanto, no intuito de polir meu raciocínio, resolvi insistir: “- Entonces, Doc., ¿la conclusión es que la interpretación no existe? Eis a resposta: - “Sí, en un sentido estricto, no existe interpretación”. O diálogo ocorreu no dia 17 de janeiro de 2012, em Santiago do Chile, durante uma aula proferida por Humberto Maturana Romesín, no Curso de Formação – Verão 2012 (CURSO ..., 2012).

[25] “- ¿Entonces no existe una realidad objetiva, sino que es la interpretación que yo haga de ella?”

[26] “- Ni siquiera se puede decir que existe algo como lo real. No se interpreta la realidad. Lo que podemos decir es que el mundo en que vivimos lo configuramos en la convivencia.”

[27] Ao menos até 1987, Humberto Maturana fez uso dos termos “explicação ontológica” e “interpretação” (Cf. MATURANA, 2003, p. 62 e 204).

[28] Neste particular, portanto, arredo-me da “modesta” noção de interpretação proposta por Michael S. Moore, professor do College of Law da University of Illinois, para quem: “Interpretation is just another activity—like sleeping, eating, teaching, or writing—that people sometimes have reason to do. None of such activities needs the justification of science to make them worthwhile, and none of them can have that justification—the generation of understanding—since they are not descriptions/explanations” (MOORE, 2000, p 452).   

[29] “... has made us the masters of creation.”

[30] “[…]. In the case of such epistemological propositions, error is not easily detected and is not very quickly punished. [...]. The erroneous premises, in fact, work.

On the other hand, the premises work only up to a certain limit, and, at some stage or under certain circumstances, if you are carrying serious epistemological errors, you will find that they do not work any more. At this point you discover to your horror that it is exceedingly difficult to get rid of the error, that it’s sticky. It is as if you had touched honey”.

[31] “Wittgenstein … les atribuye a las palabras el rol que Kant asigna a las representaciones trascendentales, esos conceptos a priori que son el esquema de lectura de todo objeto conocible.”

[32] O filósofo alemão imaginava que o processo orgânico admite continuamente o “interpretar” (NIETSZCHE, 2006, p. 430).

[33] O verbo interpretar aparece no artigo 30 da “Declaração de Direitos Humanos” da Organização das Nações Unidas, desde 1948: “Article 30. Nothing in this Declaration may be interpreted as implying for any State, group or person any right to engage in any activity or to perform any act aimed at the destruction of any of the rights and freedoms set forth herein” (grifo nosso). (Artigo 30. Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos).

[34] “Ningún suceder es verdadero o falso en sí, nada es válido o inválido en sí, nada es deseable o indeseable en sí, nada es bueno o malo en sí, nada es real o irreal en sí, algo es como surge en el vivir y convivir de los seres humanos o no humanos que lo traen al existir en su vivir-convivir de la manera que allí aparece como surge en la distinción del observador precisamente porque nada es en sí: algo existe solo según surge en la operación de distinción del observador que lo trae al existir al distinguirlo.”

[35] “Todo dizer tem a natureza de uma intepretação.”

[36] Ainda que em contexto diferente, Maturana e Varela justificam o uso da metáfora “seleção de caminhos” ou “seleção natural”, argumentando que a expressão “ya es indisociable de la historia de la biología después que Darwin la utilizara. [...]¡También la biología tiene su ontogenia!”.

[37] Não cabe aqui investigar a razão pelo qual a teoria crítica do direito e, em particular, o enfoque Direito e Literatura, até o momento, não cruzou com a epistemologia unitária de Santiago. Isso não impede, porém, que possamos enxergar entre elas uma inevitável conexão, ao menos no tocante à pretensão que ambas têm de caracterizar “o real” como feito do fazer ou do “dizer”, abrindo ensanchas para que possamos falar de um ser epistemológico, constituído pelo operar distintivo do observador na linguagem. Cf. Coutinho (2018); Roggero (2016).

[38] Cf. KREMLIN... (2022).

[39] Cf. PUTIN... (2022).

[40] Organização do Tratado do Atlântico Norte.

[41] Cf. QUEM... (2022); BOMBARDEIO... (2022).

[42] Cf. EM NOVO... (2022).

[43] Cf. PAPA… (2022).

[44] Cf. RÚSSIA… (2022).

[45] “Cada vez que en un sistema un estado surge como modificación de un estado previo, tenemos un fenómeno histórico” (MATURANA; VARELA, 2003a, p. 37).

[46] “[...], men prove they are right by their armed might.”

[47] Cf. CONDENAÇÃO... (2022).

[48] Vid. Nota 33.

[49] Cf. O OBSCURANTISMO... (2019).

[50] Cf. TALIBÃ... (2021).

[51] Cf. ATAQUES... (2021).

[52] Vid. 11 DE... (2021).

[53] Cf. EUA ... (2021).

[54] Cf. Silva (s.d).

[55] Cf. Pissurno (s.d.).

[56] Vid. OS CHOCANTES... (2020).

[57] Vid. BATE-BOCA... (2021).

[58] Harari (2017, p. 224).

[59] Vid. PRISÃO... (2018; 2019).

[60] Aragão (2015).

[61] Cf. O RECÉM-DESCOBERTO... (2022); TALIBÃ ... (2022).

[62] Cf. TODAS ... (2016).

[63] O tema é magistralmente sumariado pelo professor pernambucano Cláudio Brandão (BRANDÃO, 2002).

[64] Refiro-me a esse produto como uma oportuna metáfora da atividade interpretativa em virtude de suas características multiuso. Associada ao lema “mil e uma utilidades” a lã de aço “Bombril” destina-se basicamente à limpeza doméstica. Cf. CLÁSSICOS... (2016).

[65] Cf. Santos (2003, p. 276).

 

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