Humanidade x bestialidade: abuso sexual

20/05/2018

 

Este artigo surge como modo de organização das ideias para palestra no “1.° Fórum de Combate ao Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes”, em Ubá, tendo como foco da exposição o tema do abuso sexual, de um modo geral, com sua repercussão na infância e adolescência. Já antecipando o resultado, e pedindo escusa ao leitor pela extensão do texto, pode-se dizer que o artigo começa e termina com as mesmas perguntas: qual o limite entre humanidade e bestialidade em se tratando de comportamento sexual? Qual o princípio de definição do que seja abuso sexual?

Isso porque para se falar de abuso sexual é indispensável que se qualifique o normal uso sexual, uma vez que o conceito “abuso” pressupõe uso incorreto, excessivo, ilegítimo, indevido ou imoderado de alguma atividade ou algo. O abuso sexual é a conduta que ultrapassa o limite do que é sexualmente permitido.

Conforme a quarta edição do novo dicionário Aurélio da língua portuguesa, sexo significa: “1. Conformação particular que distingue o macho da fêmea, nos animais e nos vegetais, atribuindo-lhes um papel determinado na geração e conferindo-lhes certas características distintivas”; enquanto sexual é: “1. Pertencente ou relativo ao sexo. 2. Referente à cópula”. Já cópula, por sua vez, tem o sentido de: “1. União, ligação. 2. O ato sexual; coito”.

Outrossim, como tudo no Direito, o conceito de sexo passa de uma questão natural, ligada a geração e reprodução das espécies e chega à questão moral, à regulação da atividade sexual na sociedade humana. O regramento da conduta sexual se refere, pois, à concepção de moralidade humana, de bem e de mal, vigente em uma comunidade, com sua direta repercussão no plano jurídico, do lícito e do ilícito.

O mundo ocidental tem, nesse aspecto, noções distintas sobre o comportamento sexual na comunidade, uma oriunda dos gregos e outra do Monoteísmo.

Na Grécia a homossexualidade não era considerada um desvio moral, uma vez que a pederastia, o relacionamento sexual entre um homem adulto e um garoto a partir de doze anos, seu aprendiz, era comportamento aceito dentro da moralidade normal.

Na primeira carta a Timóteo, Paulo, por sua vez, pelo Monoteísmo, afirma-se que a Lei “não é destinada ao justo, mas aos iníquos e rebeldes, ímpios e pecadores, sacrílegos e profanadores, parricidas e matricidas, homicidas, impudicos, pederastas, mercadores de escravos, mentirosos, perjuros e para tudo o que se oponha à sã doutrina, segundo o evangelho de glória do Deus bendito, que me foi confiado” (1Tm 1, 9-11). A pederastia, portanto, ao contrário do que entendia o mundo grego, é considerada uma iniquidade para os Cristãos, algo contrário à lei, à sã doutrina, ao lado de outros comportamentos igualmente reprovados.

Também a conduta homossexual é tida como injusta, como algo que impede a união do homem com Deus: “Não vos enganeis: nem fornicadores, nem idólatras, nem adúlteros, nem afeminados, nem homens que se deitam com homens, nem ladrões, nem gananciosos, nem bêbados, nem caluniadores herdarão o Reino de Deus” (1Cor 6, 9-10). E antes disso, no livro do Levítico, atribuído a Moisés, já constavam as proibições sexuais, rejeitando-se o homossexualismo:

“Nenhum de vós se aproximará de sua parenta próxima para descobrir a sua nudez. Eu sou Iahweh. Não descobrirás a nudez do teu pai, nem a nudez da tua mãe. É tua mãe, e tu não descobrirás a sua nudez. Não descobrirás a nudez da mulher do teu pai, pois é a própria nudez de teu pai. Não descobrirás a nudez da tua irmã, quer seja filha de teu pai ou filha de tua mãe. Quer seja ela nascida em casa ou fora dela, não descobrirás sua nudez. Não descobrirás a nudez da filha do teu filho; nem a nudez da filha da tua filha. Pois a nudez delas é a tua própria nudez. Não descobrirás a nudez da filha da mulher de teu pai, nascida de teu pai. É tua irmã, e não deves descobrir a nudez dela. Não descobrirás a nudez da irmã de teu pai, pois que é a carne de teu pai. Não descobrirás a nudez da irmã de tua mãe, pois é a própria carne de tua mãe. Não descobrirás a nudez do irmão de teu pai; não te aproximarás, pois, de sua esposa, visto que é a mulher de teu tio. Não descobrirás a nudez de tua nora. É a mulher de teu filho e não descobrirás a nudez dela. Não descobrirás a nudez da mulher de teu irmão, pois é a própria nudez de teu irmão. Não descobrirás a nudez de uma mulher e a da sua filha; não tomarás a filha de seu filho, nem a filha de sua filha, para lhes descobrir a nudez. Elas são a tua própria carne: isto seria um incesto. Não tomarás para o teu harém uma mulher e, ao mesmo tempo, a irmã dela, descobrindo a nudez desta, durante a vida da sua irmã. Não te aproximarás de uma mulher, para descobrir a sua nudez, durante a sua impureza das regras. Não darás o teu leito conjugal à mulher do teu compatriota, para que não te tornes impuro com ela. Não entregarás os teus filhos para consagrá-los a Moloc, para não profanares o nome de teu Deus. Eu sou Iahweh. Não te deitarás com um homem como se deita com uma mulher. É uma abominação. Não te deitarás com animal algum; tornar-te-ias impuro. A mulher não se entregará a um animal para se ajuntar com ele. Isto é uma impureza. Não vos torneis impuros com nenhuma dessas práticas: foi por elas que se tornaram impuras as nações que expulso de diante de vós. A terra se tornou impura, eu puni a sua falta e ela vomitou os seus habitantes. Vós, porém, guardareis meus estatutos e minhas normas e não cometereis nenhuma dessas abominações, nem o cidadão e nem o estrangeiro que habita entre vós” (Lv 18, 6-26).

A pena pela prática homossexual era a morte: “O homem que se deita com outro homem como se fosse uma mulher, ambos cometeram uma abominação, deverão morrer, e o seu sangue cairá sobre eles” (Lv 20, 13).

Também o livro do Deuteronômio traz normas de comportamento sexual, ao lado de outras condutas consideradas nocivas à comunidade:

“Maldito seja aquele que desonra seu pai e sua mãe! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que desloca a fronteira do seu vizinho! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que extravia um cego no caminho! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que perverte o direito do estrangeiro, do órfão e da viúva! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que se deita com a mulher do seu pai, pois retira dela o pano do manto do seu pai! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que se deita com um animal! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que se deita com sua irmã, filha de seu pai ou filha de sua mãe! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que se deita com sua sogra! E todo o povo dirá! Amém! Maldito seja aquele que fere o seu próximo às escondidas! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que aceita suborno para matar uma pessoa inocente! E todo o povo dirá: Amém! Maldito seja aquele que não mantém as palavras desta Lei, não pondo-as em prática! E todo o povo dirá: Amém!” (Dt 27, 16-26).

A tradição considera a Bíblia como a Revelação de Deus por seu Espírito ao povo escolhido para portar uma visão superior de humanidade, uma Sabedoria eterna, passando, com Jesus Cristo, essa cosmovisão monoteísta a toda a humanidade. Deve ser ressaltado que a moral em Jesus Cristo, apesar de suas palavras de perdão e misericórdia, é ainda mais rigorosa do que a dos escritos do chamado Antigo Testamento. Falando sobre o divórcio, disse Jesus: “Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres, mas desde o princípio não era assim. E eu vos digo que todo aquele que repudiar a sua mulher — exceto por motivo de 'fornicação' — e desposar uma outra, comete adultério” (Mt 19, 8-9). Jesus também disse que alguns renunciam à atividade sexual pelo Reino de Deus, dada a sua repercussão (do sexo) nos níveis mais sutis da realidade, pela energia psíquica que o envolve, de vida e morte, eros e tânatos: “E há eunucos que se fizeram eunucos por causa do Reino dos Céus. Quem tiver capacidade para compreender, compreenda” (Mt 19, 12). Acerca do adultério: “Ouvistes que foi dito: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo: todo aquele que olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em seu coração” (Mt 5, 27-28).

Jesus Cristo trabalha seus conceitos em uma razão superior ao mero materialismo, que tem seu ápice e limite na relatividade de Einstein, Jesus encarna o Logos onipresente ou não local, já considerando o atual nível quântico, e por isso o rigor de suas ideias, na medida em que o ato sexual significa um entrelaçamento quântico entre os envolvidos, repercutindo em um nível sutil de realidade que transcende o espaço-tempo. O entrelaçamento quântico forma partículas em unidade de spin, cada uma delas com spin contrário ao da outra, unidade que transcende o espaço-tempo, como na união sexual entre homem e mulher.

A moral Cristã autêntica, portanto, é de um nível mais refinado e superior, incluindo o controle comportamental sobre as conversas e os pensamentos, que devem ser puros e santos, como o Logos, a ideia ou razão perfeita. A santidade ou saúde Cristã está ligada à contenção ou moderação, se não à abstinência, sexual, dada a sacralidade do ato sexual, o ato de criação da vida humana, que não pode ser banalizado.

Ressalte-se que no Cristianismo a imoralidade é considerada pecado, violação da Lei, conceito equivalente ao crime moderno.

“Tornai-vos, pois, imitadores de Deus, como filhos amados, e andai em amor, assim como Cristo também nos amou e se entregou por nós a Deus, como oferta e sacrifício de odor suave. Fornicação e qualquer impureza ou avareza nem sequer se nomeiem entre vós, como convém a santos. Nem ditos indecentes, picantes ou maliciosos, que não convém, mas antes ações de graças. Pois é bom que saibais que nenhum fornicário ou impuro ou avarento — que é um idólatra — tem herança no Reino de Cristo e de Deus” (Ef 5, 1-5).

Portanto, existe uma moral Cristã, colocando a sexualidade normal dentro da relação matrimonial, especialmente para a reprodução da Vida pelo casal natural, com os respectivos bons costumes cristãos, ligados a uma moral absoluta e eterna, com fundamento nas escrituras, entendidas estas como a Revelação de Deus por meio de profetas, os cientistas da antiguidade, ou seja, aqueles que alcançam um conhecimento superior e uma Verdade do Espírito e o comunica à humanidade. Na realidade, no Cristianismo, a atividade sexual sequer é necessária, como mostram o próprio Jesus, o apóstolo Paulo, Francisco de Assis e outros exemplos da melhor humanidade, e se for uma mera satisfação da carne pode até mesmo prejudicar o crescimento espiritual, do que decorre que o limite para o comportamento sexual normal é bem restrito.

De outro lado, existe uma moral materialista, limitada à localidade einsteniana, que não aceita verdades absolutas, e considera relativos e culturais os costumes sexuais, em que sexo é simples prazer corporal, o que dificulta a concepção do que seja um limite para o sexo regular, do que seja abuso sexual, notadamente quando não houver violência física.

Feitas essas considerações iniciais, é possível associar o conceito de humanidade à moralidade Cristã, porque funda os conceitos de dignidade humana e de direitos humanos, como salientado no artigo Fundamento e dependência do Direito (http://emporiododireito.com.br/leitura/fundamento-e-dependencia-do-direito), dentro de uma proposta de evolução espiritual do ser humano, sendo Jesus Cristo o caminho evolutivo, como exposto no texto anterior “Macroevolução e microevolução” (http://emporiododireito.com.br/leitura/macroevolucao-e-microevolucao-por-thiago-brega-de-assis). Em contrapartida, no ideário do Cristianismo existe a noção de bestialidade, qualificação referente ao comportamento animalesco, o comportamento com brutalidade e ignorância, como aquele praticado em contrariedade aos valores civilizatórios. O abuso sexual, nesse sentido, é um ato bestial, uma regressão ao nível animalesco, uma involução.

É sabido que a tradição Cristã e sua moralidade sexual dominaram o Ocidente até recentemente, quando suas verdades e valores passaram a ser questionados pelo materialismo científico, tendo aquela visão de mundo sido abalada pelas guerras mundiais do século XX que liberaram a besta humana no seio da cristandade, e contestada expressamente de uma forma mais marcante pelos movimentos estudantis de 1968, defendendo a liberação sexual, tendo como suportes teóricos, dentre outros, as ideias de Freud e Gramsci, ateus e materialistas.

Antes dessas “novas” ideias ganharem força, em 1940, o nosso Código Penal – CP foi editado, constando em sua Parte Especial o Título VI, que tratava dos crimes contra os costumes, que passaram a ser nomeados a partir de 2009 como crimes contra a dignidade sexual, quando foram alterados alguns dispositivos legais, relativos aos crimes sexuais, sendo que alguns deixaram de existir. Como a moral se refere à ilicitude comportamental, aos pecados ou crimes, a mudança na concepção moral teve repercussão na legislação penal. O art. 215 do CP possuía redação original “Ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude”, até 2005, quando abandonou-se o conceito de “mulher honesta” e o texto passou a “Ter conjunção carnal com mulher, mediante fraude”, sendo a norma atualmente em vigor “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”.

O crime de sedução do art. 217 deixou de existir, que tinha como redação: “Seduzir mulher virgem, menor de dezoito anos e maior de quatorze, e ter com ela conjunção carnal, aproveitando-se de sua inexperiência ou justificável confiança”. Hoje temos o art. 217-A: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”, o chamado estupro de vulnerável.

Também o crime de corrupção de menores, do art. 218, foi modificado, deixando a redação primitiva: “Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de quatorze e menor de dezoito anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo”; para a vigorar a nova “Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem”.

Os crimes de rapto deixaram de existir em 2005, que estavam tipificados nos arts. 219 ao 222 do Código Penal: “Raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou fraude, para fim libidinoso”, sendo menor a pena “Se a raptada é maior de catorze anos e menor de vinte e um, e o rapto se dá com seu consentimento”; e havia causa de redução “de um terço a pena, se o rapto é para fim de casamento, e de metade, se o agente, sem ter praticado com a vítima qualquer ato libidinoso, a restitui à liberdade ou a coloca em lugar seguro, à disposição da família”; mas “Se o agente, ao efetuar o rapto, ou em seguida a este, pratica outro crime contra a raptada, aplicam-se cumulativamente a pena correspondente ao rapto e a cominada ao outro crime”. Também deixou de existir, o crime de adultério, pela violação da fidelidade conjugal, previsto no art. 240 do mesmo estatuto, que ocorria quando alguém casado praticava ato sexual com outra pessoa.

Viu-se, portanto, nos últimos anos, um abrandamento da moralidade sexual, e uma redução da proteção da vida sexual dos menores de idade, porque a prática sexual com menores de dezoito anos era considerada abusiva, através da tipificação dos crimes de sedução, corrução de menores e estupro, este último ocorria quando praticado o sexo com menor de quatorze anos, pela presunção de violência, tal como ocorre hoje no estupro de vulnerável. O conceito de abuso sexual foi mitigado, mantida, por ora, maior proteção apenas para os casos de exploração sexual, que envolve a mercantilização do sexo. Isso porque praticar ato sexual com meninas adolescentes virgens era sedução e com meninos ou meninas não virgens era corrupção de menores, quando maiores de quatorze anos, mesmo com suposto consentimento das vítimas, buscando a norma a proteção dos adolescentes contra a depravação moral, no aspecto sexual. Agora o “consentimento” afasta o crime quando o adolescente “vítima” for maior de quatorze anos.

Pode-se pensar que a mensagem Cristã está desatualizada, é ultrapassada e arcaica, e que houve evolução da moral sexual, para maiores e menores de idade, o que é um ledo engano, sendo mais atuais que nunca os valores do Evangelho, porque ligados ao próprio conceito de humanidade, em sua unidade essencial, ontológica, no nível de conexão que é previsto pela física ou orgânica quântica. A liberação sexual significa, por sua vez, um mergulho da humanidade em direção à matéria, aos prazeres do corpo, ao comportamento egoísta e individualista, a uma negação do Espírito, produzindo efeitos psicológicos na infância e na juventude, com sua iniciação na vida sexual cada vez mais cedo, à bestialização das pessoas.

Assim, existe uma falsa ideia de evolução da moral sexual, quando o que ocorre é justamente o contrário, a involução em que se estimula a sexualidade na sociedade em detrimento da educação e da vida dos jovens, que ficam cada vez mais individualistas e menos capazes de alcançar os níveis mais elevados de intelectualidade, cultura e integridade moral, como a arte, notadamente a música, dos dias atuais comprova à exaustão, por seu nível grosseiro e sensual, além do comportamento frio e isolado dos jovens, mergulhados na ficção virtual.

Portanto, se a moral sexual era ditada com base em valores religiosos, a partir de uma visão Teocrática de mundo, de uma ordem superior, decorrendo da Revelação o que deve ser considerado lícito ou ilícito, agora os valores são avaliados segundo uma visão “democrática”, pela religião da matéria. A autoridade moral e jurídica passou de Deus, do Espírito, em sua Razão infinita, em seu Logos, para o homem, o corpo individual; o homem carnal arvorou-se deus, colocando-se no lugar de Deus. A razão espiritual deu lugar à sensação carnal.

Por isso, sendo os valores de Jesus Cristo a base do que consideramos a civilização humana, e do que pensamos por humanidade, considero que a “evolução sexual” na realidade é uma involução, um mergulho no materialismo, predito pelas próprias Escrituras, e por isso vivemos o tempo da inversão dos valores, do anticristo, da bestialidade, e a questão sexual é apenas uma das expressões desse fato. Como já havia antecipado o apóstolo Paulo:

“Sabe, porém, o seguinte: nos últimos dias sobrevirão momentos difíceis. Os homens serão egoístas, gananciosos, jactanciosos, soberbos, blasfemos, rebeldes com os pais, ingratos, iníquos, sem afeto, implacáveis, mentirosos, incontinentes, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres do que de Deus; guardarão as aparências da piedade, negando-lhe, entretanto, o poder. Afasta-te também destes. Entre estes se encontram os que se introduzem nas casas e conseguem cativar mulherzinhas carregadas de pecados, possuídas de toda sorte de desejos, sempre aprendendo, mas sem jamais poder atingir o conhecimento da verdade” (2Tm 3, 1-7).

A ciência materialista, que pretende ser portadora da verdade científica, em confronto com os profetas que falaram da parte de Deus, do Logos, da Sabedoria, a verdadeira Ciência, portanto, na realidade, a ciência materialista não tem conhecimento, portando-se como um falso profeta, sendo seu efeito o surgimento do homem iníquo e egoísta que vemos na sociedade, com a atomização das pessoas, e com a destruição do planeta nos níveis material, moral e cultural. E por isso também o Estado foi tomado por esse falso profeta, como consta no livro da Revelação, por isso é chamado de Besta, a do Apocalipse, que domina as relações políticas e econômicas, causando as guerras, chegando a falsa ciência mais recentemente à (i)moralidade sexual.

O falso profeta cria uma falsa ideia da realidade dizendo que esta se limita à matéria visível e aos corpos individuais, provocando a corrupção mental, que é a primeira corrupção, da qual o abuso sexual é consequência. Todos os crimes e pecados começam na mente, que primeiro é amortecida ou desviada da verdade, para, então, permitir a prática delituosa no plano corporal. Da proposta de um Espírito humano e coletivo passa-se à ideia de domínio da sensualidade dos corpos, supostamente independentes uns dos outros. Primeiro cria-se uma nova ideia normalidade, de que não há ordem absoluta, relativizando-se os valores, tentando normalizar o anormal, normalizar o abuso, pelo “progresso moral”, e assim o que era ordem se transforma ideologicamente em opressão, exigindo a liberação, e daí os limites são modificados até serem eliminados, o que era proibido passa a lícito, e o que era abuso deixa de sê-lo, porque os critérios de moralidade sexual são apenas relativos e locais. A violência física foi substituída pela violência mental, e o elevadíssimo consumo de drogas, medicamentos psiquiátricos, e drogas ilícitas é a prova cabal desse fato.

A esquizofrenia da legislação, que se baseia cada vez mais na ciência materialista, no falso profeta, é tamanha que se concebe como legal um maior de dezoito anos praticar ato sexual com um menor de idade, desde que maior de quatorze anos, mas se a mesma pessoa vender um vídeo pornográfico para o mesmo menor incidirá em infração administrativa, por violação ao art. 256 do Estatuto da Criança e do Adolescente. O ato sexual em si, a própria violação corporal, é atípico, mas a venda de imagens dessa natureza é ilegal.

Adolescentes de doze ou treze anos que praticam atos sexuais recíprocos são, ao mesmo tempo, vítimas e autores de infração, de ato infracional equiparado ao crime de estupro de vulnerável.

Assim, ocorreu a relativização da proibição sexual, pelo avanço das ideias materialistas, segundo uma visão “democrática” da vida social. O problema dessa evolução é a falta de critérios objetivos para a definição do uso normal e do abuso sexual. Não se sabe até quando poderá avançar essa liberação, ou quais seus limites, porque o critério de referência é o prazer individual.

Seria normal que um adolescente com quinze anos praticasse atos sexuais com um animal? Seria situação de risco?

Haveria possibilidade de redução da “capacidade sexual” dos adolescentes, considerando que as meninas têm seus ciclos menstruais cada vez mais novas, aos oito ou nove anos, de modo a passar a tolerar como normal sua atividade sexual nessa idade? Se o que importa é o prazer, qual o limite para definir o uso ou abuso sexual, inclusive em relação a recém-nascidos, se não houver violência física?

Antes era crime ou pecado a prática sexual com menor de idade. Hoje o crime somente ocorre caso o adolescente tenha menos de quatorze anos, até que a idade mínima de consenso seja reduzida. Assim, seria crime os pais praticarem sexo “consensual” no âmbito doméstico com filhos de maiores de quatorze anos?

Se a proibição do casamento entre parentes tem fundamento na moral Cristã, seria possível “evoluir” para o casamento entre pais e filhos ou irmãos? A solução materialista para o problema da deficiência da criança (antevista pelos profetas do Altíssimo) já está posta: aborto. Essa é a resposta de uma sociedade materialista pela sexualidade estimulada, pois para o problema da gravidez indesejada, decorrente do sexo sem controle, a solução já existe e é amplamente defendida, o aborto.

Se hoje é considerado normal o “casamento” entre pessoas do mesmo sexo, qual o motivo da proibição de casamento entre irmãos, ou entre ascendentes e descendentes?

Destarte, se a “dignidade” é base para defesa da mutilação humana, para sustentar o “direito” de a mulher abortar, a despeito do direito fundamental da inviolabilidade da vida, ou para entender como “digno” o “casamento” entre pessoas do mesmo sexo, quando a Constituição afirma o casamento entre homem e mulher, basta uma interpretação “iluminista” da Constituição, defendendo a “dignidade” das crianças e adolescentes, e seu “direito” ao prazer sexual, independentemente da idade, para que, sem mudança no texto constitucional, as aberrações a abominações mencionadas nas perguntas acima sejam consideradas “normais” ou “lícitas”. Se não há Providência ou uma Lei da Natureza, e o mundo for regido pelo acaso, pela aleatoriedade, toda essa bestialidade poderá vir a ser considerada “humana”. Como já afirmou Dostoiévski, por uma de suas personagens: “Se Deus não existe, tudo é permitido”.

O limite consensual “democrático” é artificial, e sempre passível de alteração, porque não está ligado a critérios naturais, ontológicos ou absolutos, como aqueles ditados pelas ideias de Cristo. Por isso, as perguntas que permanecem, então, são: Existe um limite para esse “consenso democrático”? Qual é esse limite? Qual o conceito de sexualidade normal para a humanidade? Se não há normalidade, não há abuso.

Imagem Ilustrativa do Post: "Liberation" // Foto de: Green Chameleon on Unsplashed // Sem alterações

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